Entre 2019 e 2021, a desigualdade no mercado de trabalho segundo sexo e raça se agravou. Homens e mulheres negros1 são os que menos conseguem trabalhar de forma regular, apresentando elevadas parcelas em ocupações com menor duração, no desemprego e na inatividade involuntária.
Esse estudo apresenta informações da pesquisa longitudinal Trajetórias Ocupacionais, realizada na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), que acompanhou os mesmos indivíduos,
entrevistados em 2019 e 2021, em situações de permanência ou trânsito entre ocupação, desemprego e inatividade.
Oportunidades de trabalho são diferentes entre grupos populacionais
A crise decorrente da pandemia de Covid-19 piorou a inserção da população no mercado de trabalho metropolitano, especialmente para as mulheres. Enquanto cerca de 60% dos homens que estavam ocupados em 2019 permaneceram nesta condição em 2021, para as mulheres esse percentual ficou em torno de 40%.
Para os que estavam desempregados ou inativos em 2019 e continuaram na mesma condição em 2021, essa relação se inverteu. Enquanto 34% das mulheres negras e 39% das não negras estavam
desempregadas ou inativas, para os homens negros (18%) e os homens não negros (21%), essa parcela era menor.
Entre as pessoas que, nos dois períodos de entrevista, alternaram situações de ocupação, desemprego ou inatividade, devido à dificuldade de encontrar um emprego permanente ou de maior duração, as mulheres negras apresentaram o maior porcentual (28%) e os homens não negros, o menor (17%).
Distribuição da população de 18 anos e mais, por sexo e raça, segundo condição de atividade
Região Metropolitana de São Paulo, 2019-2021, em %
Condições de trabalho também se diferenciam segundo grupos populacionais
Considerando a situação das pessoas ocupadas em 2021, verifica-se que, mesmo quando ocupada, a população negra enfrenta situações piores em relação à não negra:
• na indústria, estavam cerca de 24% do total de homens e 13% das mulheres não negras, mas apenas 9% das mulheres negras;
• parcelas mais elevadas nas ocupações sem formalização (trabalho por conta própria e emprego sem registro em carteira) permanecem sendo masculinas, mas sempre maiores para negros (33%
dos homens e 26% das mulheres) do que não negros (29% dos homens e 22% das mulheres);
• 84% de homens negros e 83% de mulheres negras que trabalhavam como conta própria, dono de negócio familiar, empregador e trabalhador doméstico sem registro em carteira tiveram redução
do volume de trabalho, em relação ao período anterior à pandemia, parcelas maiores do que a das mulheres não negras (69%) e a dos homens não negros (79%);
• a proporção de mulheres negras com menos de dois anos no trabalho (42%) supera em 10 p.p. a de mulheres não negras (32%) e também é mais elevada do que a de homens negros (37%) e não
negros (29%).
Proporção de trabalhadores conta própria (1) que informaram menor volume de trabalho ou número de clientes, em relação ao período anterior à pandemia, por sexo e raça
Região Metropolitana de São Paulo, 2021, em %
(1) Incluem conta própria, dono de negócio familiar, empregador e trabalhador doméstico sem registro de carteira.
Distribuição dos ocupados de 18 anos e mais, por sexo e raça, segundo tempo de permanência no atual trabalho ou negócio
Região Metropolitana de São Paulo, 2021, em %
Ocupados negros fazem menos jornadas de trabalho em tempo integral
A realização de jornada integral é um dos fatores que possibilitam maiores rendimentos aos ocupados:
• as mulheres e homens não negros apresentaram maiores proporções entre os que realizam jornada integral (71% e 69%, respectivamente), em relação aos homens e mulheres negros;
• entre aqueles com jornadas de tempo parcial, turnos ou que fazem seu próprio horário, as mulheres negras (32%) e os homens negros (36%) registraram percentuais mais elevados do que
homens e mulheres não negros.
Distribuição dos ocupados de 18 anos e mais, por sexo e raça, segundo jornada de trabalho
Região Metropolitana de São Paulo, 2021, em %
Teletrabalho diminui em 2021
Embora 76% dos ocupados não tenham realizado nenhuma atividade em teletrabalho entre 2019 e 2021, a parcela que realizou e não faz mais nenhuma atividade nesta condição alcançou 14% dos ocupados. No período da pandemia, o teletrabalho entre os não negros foi quase o dobro daquele entre os negros, tanto para os homens (13% e 7%, respectivamente) quanto para as mulheres (25% e 13%).
Apenas uma pequena porcentagem de ocupados (9%) permaneceu em teletrabalho em 2021. Somando os que estavam integralmente em teletrabalho e os que estavam em regime híbrido, havia 12% de mulheres (15% entre as não negras e 8% entre as negras) e 7% dos homens (10% entre os não negros e 4% entre os negros).
Proporção de ocupados de 18 anos e mais, por sexo e raça, segundo realização de teletrabalho
Região Metropolitana de São Paulo, 2021, em %
Desemprego e inatividade afetam mais as mulheres
Na pandemia, a fronteira entre o desemprego e a inatividade ficou mais estreita devido às restrições de funcionamento de negócios e às limitações de circulação decorrentes da Covid-19, mas afetou mais a população negra:
• a taxa de desemprego das mulheres negras foi a que mais aumentou no período analisado, alcançando 23,0%, enquanto para os homens não negros essa taxa foi de 9,8%. A diferença desse indicador entre elas e os homens não negros, que era de 11 p.p. em 2019, passou para 13 p.p. em 2021;
• a inatividade ampliou-se para todos os grupos populacionais, entre 2019 e 2021. No entanto, é muito mais elevada para as mulheres do que para os homens: alcançou 43% entre as não negras
e 36% entre as negras, enquanto entre os homens não negros era de 24% (19 p.p. menor que das mulheres não negras) e para os negros correspondeu a 20% (16 p.p. menor que das mulheres negras).
Taxas de desemprego da população de 18 anos e mais, por sexo e raça
Região Metropolitana de São Paulo, 2019-2021, em %
Proporção dos inativos de 18 anos e mais, por sexo e raça
Região Metropolitana de São Paulo, 2019-2021, em %
Ao verificar os motivos da permanência na inatividade e da não procura por trabalho, evidencia-se a característica etária de envelhecimento da população (cerca de 15% da população possui 60 anos e mais na RMSP):
• a aposentadoria aparece como um dos principais motivos para a não procura de trabalho pelos inativos, com significativa diferença entre a parcela de aposentados inativos negros (homens 53% e
mulheres 35%) e não negros (homens 70% e mulheres 46%);
• entre as mulheres, é relevante a permanência na inatividade devido à necessidade de cuidar de filhos e parentes, afazeres domésticos e eventual gravidez. Essa situação foi citada por 44% das
mulheres inativas, tanto negras como não negras, e quase não foi indicada entre os homens.
A realização de algum bico entre os inativos alcançou 3% em 2021, parcela maior entre negros do que entre não negros. Já para os desempregados, 14% utilizaram esse recurso, com proporção
pouco maior entre os homens em relação às mulheres.
NOTA METODOLÓGICA
A pesquisa Trajetórias Ocupacionais é uma iniciativa inovadora da Fundação Seade para obter dados longitudinais sobre o mercado de trabalho. Referenciada na Região Metropolitana de São Paulo, utilizou amostra painel em três tomadas – 2019, 2020 e 2021.