A pandemia de Covid-19 afetou fortemente o mercado de trabalho na Região Metropolitana de São Paulo. Menos ocupações, mais desemprego e mais desalento são expressões da crise causada
pela pandemia. Este processo afetou também o padrão de remuneração do trabalho e, em consequência, a renda das famílias.
Entre 2019 e 2020, a renda média do trabalho diminuiu 8% em termos reais. Esta queda ocorreu para todos os segmentos populacionais e todas as formas de inserção no mercado de trabalho.
Somados os decréscimos da ocupação e da renda do trabalho, o impacto sobre a renda domiciliar per capita foi forte, com redução de 23% no período. Em decorrência, mais da metade das famílias residentes na RMSP passou a dispor de renda menor em 2020 do que em 2019.
Ocupados que permaneceram no mesmo trabalho perderam menos renda
Embora a redução da renda do trabalho tenha sido generalizada, os ocupados que se mantiveram no mesmo trabalho entre 2019 e 2020 tiveram perdas menores do que aqueles que mudaram de trabalho. Entre os primeiros, a renda do trabalho diminuiu 9,9%, enquanto entre aqueles que mudaram de trabalho a queda foi quase o dobro, de 18,1% em termos reais em um ano.
Todos perderam, mas as diferenças no patamar de rendimento persistiram elevadas. Em 2019, os ocupados que não mudaram de trabalho ganhavam, em média, 56% a mais do que aqueles que mudaram, diferença que cresceu para 71% em 2020. As pessoas que estavam inativas ou desempregadas em 2019 e conseguiram um trabalho em 2020 recebiam, em média, R$ 1.202, pouco mais que um salário mínimo e metade da renda média dos que permaneceram no mesmo trabalho.
Vale destacar ainda que esses ocupados que conseguiram trabalho em 2020 ganhavam menos do que aqueles que estavam ocupados em 2019, mas se tornaram desempregados ou inativos em 2020 (R$ 1.702). Ou seja, as novas oportunidades em 2020 tenderam a oferecer menores remunerações em comparação àquelas que foram eliminadas entre 2019 e 2020.
Rendimento médio real (1) dos ocupados, por permanência no trabalho
RMSP, 2019-2020
(1) Inflator utilizado: INPC. Valores em reais de março de 2021. Excluem-se os assalariados e os empregados domésticos assalariados que não tiveram remuneração no mês.
Cresceu a desigualdade de renda entre os ocupados que não mudaram de trabalho
Mesmo entre os ocupados que permaneceram no mesmo trabalho, as perdas de renda foram muito diferenciadas, aprofundando desigualdades já existentes.
Por posição na ocupação, as reduções foram muito maiores entre os que trabalhavam por conta própria em 2019 e em 2020, cujo rendimento real decresceu 15% em apenas um ano. O rendimento dos que permaneceram em postos assalariados também diminuiu no período, mas menos intensamente (7%). Em decorrência, a diferença de remuneração entre os dois segmentos aumentou, com a renda dos conta própria 26% menor do que a dos assalariados, percentual que correspondia a 19% em 2019.
Rendimento médio real (1) dos ocupados que permaneceram no mesmo trabalho em 2019 e 2020, por posição na ocupação
1) Inflator utilizado: INPC. Valores em reais de março de 2021. Excluem-se os assalariados e os empregados domésticos assalariados que não tiveram remuneração no mês.
Por atributos pessoais, mulheres (14%) e pessoas de 40 anos e mais (11%) tiveram perdas maiores do que homens e pessoas mais jovens. Por instrução, a redução da renda média do trabalho foi de 10% em termos reais, independentemente do nível de escolaridade. Como diferencial, houve retração maior da renda média entre pessoas não negras do que entre as negras, mas estas permaneceram ganhando, em média, 77% da remuneração das não negras. Para todos os segmentos, as diferenças de patamar de remuneração existentes em 2019 foram mantidas ou aprofundadas em 2020.
Rendimento médio real (1) dos ocupados que permaneceram no mesmo trabalho em 2019 e 2020, por atributos pessoais
(1) Inflator utilizado: INPC. Valores em reais de março de 2021. Excluem-se os assalariados e os empregados domésticos assalariados que não tiveram remuneração no mês.
Forte queda da renda domiciliar, mesmo com recebimento do auxílio emergencial
A renda das famílias residentes na RMSP foi afetada por dois movimentos desfavoráveis em 2020: de um lado, a diminuição no número de ocupados, da ordem de 1,37 milhão de pessoas; e, de
outro, a generalizada redução da renda do trabalho. O resultado foi uma queda de 23% na renda domiciliar per capita, que passou de R$ 1.614 para R$ 1.242 por pessoa, entre 2019 e 2020.
Esta perda de poder de compra foi diferenciada conforme o recebimento do auxílio emergencial em 2020. As famílias que receberam o auxílio já tinham renda per capita menor em 2019 e foram
mais afetadas pela crise em 2020. Sua renda média por pessoa diminuiu 25%, chegando a R$ 779, menos da metade da renda per capita das famílias que não receberam o auxílio (R$ 1.680). Entre
estas, a redução da renda foi menos intensa (20%).
Esta diminuição fez com que, em 2020, 59% das famílias residentes na RMSP tivessem renda per capita menor do que em 2019. Este empobrecimento deveu-se a uma redução expressiva na parcela de famílias com renda igual ou maior do que um salário mínimo per capita, em um movimento do segmento superior de renda para os segmentos médios, processo diferenciado em relação a outros momentos de crise.
Distribuição dos domicílios, segundo renda domiciliar per capita em salários mínimos (1)
RMSP, 2019-2020
(1) Inflator utilizado: INPC. Salário mínimo de março de 2021.
NOTA METODOLÓGICA
A pesquisa Trajetórias Ocupacionais é uma iniciativa inovadora da Fundação Seade para obter dados longitudinais sobre o mercado de trabalho. Esta edição feita na Região Metropolitana de São Paulo utilizou amostra painel em duas tomadas – no último trimestre de 2019 e de 2020 –, entrevistando as mesmas pessoas com 18 anos e mais, com exceção das inativas aposentadas.